A
glória do nosso Senhor Jesus Cristo é por demais grande para que as nossas
pequenas mentes a possam entender. Desta forma, nunca pode- remos dar a Ele o
louvor que Lhe é devido. No entanto, através da fé podemos ter algum
conhecimento de Cristo e Sua glória, e esse conhecimento é melhor que qualquer
outra forma de sabedoria ou entendimento. O apóstolo Paulo disse: "E, na
verdade, tenho também por perda todas as coisas, pela excelência do
conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor" (Filipenses 3:8). Se a nossa
felicidade futura significa estar onde Cristo está e ver a Sua glória, não há
melhor preparação para isso que encher os nossos pensamentos com ela desde
agora. Assim, estaremos gradualmente sendo transformados naquela glória.
É apenas de Cristo
que podemos nos ufanar e nos gloriar, pelas seguintes razões:
1.
A nossa natureza humana foi no princípio feita em Adão e Eva à imagem de Deus,
cheia de beleza e glória. Todavia, o pecado derrubou essa glória no pó e a
natureza humana tornou-se completamente diferente de Deus, cuja imagem ela
havia perdido. Satanás assumiu o controle e, se as coisas fossem deixadas dessa
forma, a humanidade teria pereci- do eternamente. Mas, o Senhor Jesus, o Filho
de Deus, curvou-Se em grande perdão e amor para assumir a natureza humana.
Assim, a nossa natureza humana, após ter mergulhado nas maiores profundezas da
miséria, agora foi erguida acima de toda a criação de Deus, pois Deus exaltou a
Cristo “... pondo-o à sua direita nos céus, acima de todo o principado, e
poder, e potestade, e domínio, e de todo o nome que se nomeia, não só neste
século, mas também no vindouro" (Efésios 1:20-21). Aqueles que receberam
fé e graça para entenderem corretamente o propósito da natureza humana, devem
se regozijar porque ela foi elevada das profundezas do pecado para a glória que
agora recebeu mediante a honra concedida a Cristo.
2.
Em Cristo, o relacionamento da nossa natureza com Deus é sempre o mesmo.
Contudo, a nossa amizade original com Deus, na criação, foi rompida pela queda
do homem. Os seres humanos se tornaram inimigos de Deus. Mas a sabedoria e a
graça de Deus planejaram restabelecer novamente a nossa natureza à semelhança
da Sua, e fazê-lo de tal forma que tornasse qualquer separação entre nós e Ele
impossível. Não podemos deixar de nos admirar que a nossa natureza possa
participar da vida gloriosa de Deus. A sabedoria onipotente, poder e bondade
tornaram isso possível através de Cristo. Esta obra de Deus é parte do mistério
da piedade que os anjos desejam perscrutar. (I Pedro 1:12). Quão pecaminosos e
tolos seremos nós se pensarmos muito em outras coisas e não O suficiente nisso.
O grande amor de Deus para com a humanidade é demonstrado pelo fato de o Filho
de Deus não ter vindo à terra como um anjo, e sim como homem — o homem Cristo Jesus
— tendo natureza humana como a nossa.
3.
Cristo mostrou que é possível para a nossa natureza humana morar no céu. As
nossas mentes não podem entender o número e as distâncias das estrelas no céu.
Como, então, supomos que os seres humanos podem morar num céu mais glorioso que
o firmamento? Todavia, a nossa natureza, no homem Cristo Jesus foi para o céu
eterno de luz e glória e Ele prometeu que onde estivesse ali estaríamos com Ele
para sempre.
Tentações,
provações, tristezas, temores, medos e doenças são parte desta vida presente.
Todas as nossas ocupações têm problemas e tristezas nelas. Se considerarmos
porém, a glória de Cristo que iremos compartilhar, podemos obter alívio de
todos esses males e ganhar a vitória sobre eles. "Em tudo somos atribulados,
mas não angustiados; perplexos, mas não desanimados; perseguidos, mas não
desamparados; abatidos mas não destruídos. Por isso não desfalecemos: mas ainda
que o nosso homem exterior se corrompa, o interior, contudo, se renova de dia
em dia, porque a nossa leve e momentânea tribulação produz para nós um peso
eterno de glória mui excelente; não atentando nós nas coisas que se vêem mas
nas que não se vêem; porque as que se vêem são temporárias, e as que não se
vêem são eternas" (11 Coríntios 4:8-9,16-18). O que são todas as coisas
desta vida, quer sejam boas ou más, comparadas com o benefício a nós da
excelente glória de Cristo?
A
condição em que as nossas mentes se encontram é o que geralmente nos causa os
maiores problemas. O salmista perguntava a si mesmo: "Por que estás
abatida, ó minha alma, e por que te perturbas em mim? Espera em Deus, pois
ainda o louvarei na salvação da sua presença" (Salmo 42:5,11).
A
centralização de nossos pensamentos, pela fé na glória de Cristo, trará paz e
calma à mente perturbada e desordenada. É através de Cristo que “... temos
entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na
esperança da glória de Deus... porquanto o amor de Deus está derramado em
nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado" (Romanos 5:2-5).
Podemos
até pensar com alegria na morte quando fixamos nossos pensamentos na glória de
Cristo. Muitos vivem com receio da morte todos os seus dias. Como podemos vencer estes temores?
1.
Devemos deliberadamente entregar as nossas almas, ao partirmos deste mundo, nas
mãos dAquele que pode recebê-las e guardá-las. A alma, sozinha e por si mesma,
tem que ir para a eternidade. Ela deixa para trás, para sempre, tudo o que
conheceu anteriormente pelas suas faculdades próprias e naturais.
Deve
haver, portanto, um ato de fé ao entregar a alma à disposição de Deus, como
Paulo foi capaz de fazer. “... eu sei em quem tenho crido, e estou certo de que
é poderoso para guardar o meu depósito até aquele dia" (11 Timóteo 1:12).
O
Senhor Jesus Cristo é o nosso grande exemplo. Quando Ele despediu o Seu
espírito, Ele entregou a Sua alma nas mãos de Deus o Pai, em total confiança
que ela não sofreria nenhum mal. "Portanto está alegre o meu coração e se
regozija a minha glória: também a minha carne re- pousará segura. Pois não
deixarás a minha alma no inferno, nem permitirás que o teu Santo veja
corrupção" (Salmo 16:9-10). O último e vitorioso ato de fé acontece .na
morte. A alma poderá, então, dizer para si mesma: "Você está agora
deixando o tempo e entrando naquelas coisas eternas que o olho natural não viu,
nem o ouvido ouviu, nem o coração do homem tem sido capaz de imaginar. Desta
forma, em silêncio e confiança entregue-se à soberana graça, verdade e
fidelidade de Deus, c encontrarás descanso e paz". Jesus Cristo
imediatamente recebe a alma daqueles que crêem nEle, como no caso de Estevão.
Quando
morria, ele disse: "Senhor Jesus, receba o meu espírito" (Atos 7:59).
O que poderia ser de maior encorajamento para entregar as nossas almas nas mãos
de Cristo, na hora da morte, do que conhecer em cada dia de nossas vidas alguma
coisa de Sua glória, do Seu poder e da Sua graça?
2.
Como seres humanos, não somos semelhantes aos anjos que são apenas espírito e
não podem morrer. Nem somos semelhantes aos animais que não possuem alma
eterna. Mas Deus designou para nós uma ressurreição gloriosa do corpo que não
mais terá uma natureza física; seremos mais semelhantes aos anjos. Nesta vida
há uma relação tão íntima entre alma e corpo que nós tentamos tirar da cabeça
qualquer pensamento sobre a sua separação. Como é possível, então, ter tal
disposição de morrer, a exemplo do apóstolo Paulo quando disse: "mas de
ambos os lados estou em aperto, tendo desejo de partir, e estar com Cristo, por
que isto é ainda muito melhor" (Filipenses 1:23)? Essa disposição só pode
ser encontrada se olharmos pela fé para Cristo e Sua glória, tendo a certeza
que estar com Ele é melhor do que tudo quanto esta vida possa oferecer.
Se
quisermos morrer alegremente, devemos pensar em como Deus nos chamará do túmulo
na ressurreição. Então, pelo Seu grandioso poder, Ele não apenas nos restaurará
à glória de Adão e Eva na criação, como também nos acrescentará ricas bênçãos
além da nossa imaginação. Devemos, também, nos lembrar que apesar do corpo e da
alma do nosso glorioso Salvador terem sido separados na morte (à semelhança que
os nossos também o serão), Ele agora possui grande glória. O Seu exemplo pode
nos dar esperança.
3.
Deve haver uma disposição nossa em aceitar o tempo de Deus para morrermos.
Podemos, à semelhança de Moisés, desejar ver mais da gloriosa obra de Deus em
favor do Seu povo na terra. Ou, à semelhança de Paulo, podemos sentir que seja
necessário, para o benefício de outros, que vivamos um pouco mais. Pode ser que
desejemos ver as nossas famílias e as nossas coisas numa condição melhor e mais
estabelecidas.
Mas
não podemos ter paz neste mundo, a não ser que estejamos dis- postos a nos
submeter à vontade de Deus com respeito à morte. Os nossos dias estão em Suas
mãos, à Sua soberana disposição. Devemos aceitar isso como sendo o melhor.
4.
Alguns podem não temer a morte, porém podem temer a maneira como morrerão. Uma
longa doença, grandes dores, ou alguma forma de violência poderiam ser uma
maneira de trazer a nossa vida terrena a um fim. Devemos ser sábios, como se
estivéssemos sempre prontos para passar por qualquer experiência que Deus nos
permita passar. Não seria correto que Ele fizesse o que deseja com o que Lhe
pertence? Acaso a vontade dEle não é infinitamente santa, sábia, justa e boa em
todas as coisas? Ele não sabe o que é melhor para nós e o que trará maior
glória para Si mesmo? Muitas pessoas descobriram que são capazes de suportar as
coisas que mais temiam porque receberam maior força e paz do que podiam
imaginar que lhes fosse dado.
No
entanto, nenhuma dessas quatro coisas podemos fazer, a não ser que acreditemos
na excelente glória de Cristo e desfrutemos dela.
Muitas
outras vantagens de se meditar na glória de Cristo ainda poderiam ser ditas,
porém a minha fraqueza e a proximidade da morte me impedem que eu escreva aqui
com maiores detalhes.
________
Extraído
do livro A Glória de Cristo de John Owen, Editora PES, pp.7-10
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